O que é arte de vanguarda?

Composition II, Karel Appel, 1970

Os movimentos artísticos de vanguarda são aqueles atuam de maneira crítica com relação ao estatuto estabelecido sobre o que é arte e com relação às práticas sociais, colocando em questão os valores da sociedade burguesa contemporânea. Por conta de suas características, as obras de vanguarda estão sempre transgredindo os limites instituídos a respeito do que é entendido por arte.

As artes de vanguarda costumam se exprimir por meio de criações e obras de arte experimentais, que possuem um caráter inovador, muitas vezes não sendo aceitas inicialmente no contexto social de uma época, por desafiar o modelo de arte vigente, bem como os formatos e as noções estabelecidos sobre a arte com base na tradição.

Esses movimentos artísticos são múltiplos e diversos, aparecendo de maneira mais intensa entre o final do século XIX e meados do século XX. A perspectiva de vanguarda entende que a arte tem um papel político, em favor de uma mudança social. Nos Estados Unidos, durante a década de 1960, os artistas de vanguarda produziam arte com elementos do contexto de industrialização crescente, se opondo à conformidade da cultura popular, criticando a tendência do modo de vida consumista.

O termo vanguarda vem do francês "avant-garde", que significa "guarda avançada", esse termo era usado pelos militares franceses fazendo referência a um pequeno grupo que explorava à frente da tropa. No século XIX, passou a ser associado aos radicais franceses de esquerda que defendiam reformas políticas. Do final do século XIX em diante, avant-garde passou a ser usado para se referir a produções artísticas e estéticas inovadoras.

Uma das principais características dos movimentos de vanguarda é sua postura de questionar a instituição arte, enquanto uma instância separada da prática da vida. De modo geral, os movimentos de arte de vanguarda rejeitam a ideia de arte como uma representação alheia ao mundo, pois entendem que a arte é um processo que ocorre implicado no mundo, na vida e nas relações, em constante movimento e transformação.

"Até princípios do século XX, os músicos utilizavam apenas uma parte reduzidíssima das possibilidades do mundo sonoro. Em quase todas as civilizações evoluídas, os ruídos representavam uma posição muito baixa na escala de valores musicais, e isto embora não existisse nenhuma diferença física básica entre som e ruído. Foi esta a revelação musical mais importante do movimento futurista italiano, que não hesitou em incorporar o ruído na criação musical."
(Montserrat, em 'A música contemporânea')

Na perspectiva tradicional de arte, o sentido da arte é associado a uma tradição que a entende como um processo onde suas partes compõem uma grande unidade representativa, tendo seu sentido atrelado a uma noção do todo. Nas artes de vanguarda, o todo não sobrepõe as partes, pois as partes já são uma intenção da obra. Além disso, nas obras de vanguarda não há um sentido único, mas múltiplos sentidos possíveis.

Essas tendências críticas e inovadoras da arte de vanguarda costumam chocar os espectadores. O artista de vanguarda se expressa em diferentes linguagens, de modo que há tanto escritores, quanto pintores, compositores, arquitetos, dramaturgos, entre outros. A característica em comum entre eles consiste em sua postura que desafia as concepções sobre o que é arte e os valores da sociedade burguesa contemporânea.

O artista de vanguarda pretende oferecer uma crítica e um questionamento ao espectador, para que este possa refletir sobre seus modos de vida, seus valores e perspectivas, buscando implicar no mundo e promover transformações. A arte se apresenta como um estímulo, uma proposta de experimentar outra perspectiva sobre a vida, quebrando paradigmas e tradições, visando uma transformação singular.

A vanguarda se coloca também como uma instância crítica da arte enquanto instituição e da estrutura social onde a arte é produzida. Os movimentos de vanguarda não questionam apenas uma ou outra forma de arte específica, mas toda a instituição arte, que determina e define a produção e a distribuição artística, que delimita o que é ou não arte. O intuito desta critica é retomar na arte seu papel criativo e sua relação com a vida.

Suas críticas sobre a instituição da arte não buscam instituir um novo modo de se fazer arte, mas ampliar a possibilidade de outros modos de se fazer arte, mais livres, experimentais e inventivos, menos determinados e definidos. Além disso, busca-se retomar a relação entre a criação de arte e os modos de vida, reconhecendo o contexto onde a arte é produzida, as circunstâncias e os materiais que atravessam a experiência de vida.

Entre os artistas de vanguarda podemos destacar na música Arnold Schöenberg, Igor Stravinsky, Luigi Russolo, Edgard Varese, John Cage, Iannis Xenakis, Morton Feldman, Karlheinz Stockhausen, Sun Ra, John Coltrane, Meredith Monk, Laurie Anderson, entre outros. Nas artes plásticas: Wassily Kandinsky, Pablo Picasso, Paul Klee, Edvard Munch, Joan Miró, Henri Matisse, Salvador Dali, René Magritte, Max Ernst, Marcel Duchamp, Jean Dubuffet, Andy Warhol, Karel Appel, Jean-Michel Basquiat, entre outros.

No Brasil há grandes nomes entre os artistas de vanguarda, tais como Mario de Andrade, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, Heitor Villa-Lobos, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Mario Pedrosa, Victor Brecheret, Candido Portinari, Hélio Oiticica, Lygia Pape, Lygia Clark, Augusto de Campos, Décio Pignatari, Glauber Rocha, Beatriz Milhazes, Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção, Wesley Duke Lee, Rubem Grilo.

Entre os movimentos artísticos de vanguarda, pode-se destacar a arte conceitual, o dadaísmo, o expressionismo, o fauvismo, o cubismo, o futurismo, o abstracionismo, o minimalismo, o concretismo, o cinema novo, o neo-dadá, a arte pop, o surrealismo, o tropicalismo, entre outros. Há também que se destacar os grupos Grupo dos Seis, Grupo Vanguarda Fluxus e CoBrA.


Por Bruno Carrasco, terapeuta, professor e questionador, graduado em psicologia, licenciado em filosofia e pedagogia, pós-graduado em ensino de filosofia, psicoterapia fenomenológico existencial e aconselhamento filosófico. Nos últimos anos se dedica a filosofia da diferença e psicologia crítica.

Referências:
ALBET, Montserrat. A Música Contemporânea. Rio de Janeiro: Salvat, 1979.
BÜRGER, Peter. Teoria da vanguarda. Trad.: Ernesto Sampaio. Lisboa: Vega, 1993.
Couto, M. de F. M. (2011). A arte de vanguarda no Brasil e seus manifestos. Revista Do Instituto De Estudos Brasileiros, (53), 89-106.

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