Terapia sem julgamentos


A relação terapêutica sem julgamentos acontece quando o terapeuta não foca sua atenção somente numa dificuldade específica da pessoa atendida, mas se atenta para a pessoa como um todo, inclusive suas potencialidades existenciais.

É muito comum na psicologia o procedimento de avaliação diagnóstica, onde o psicoterapeuta observa a pessoa, escuta suas queixas e elabora uma avaliação sobre a qual irá direcionar seu trabalho. Livros como o CID (Código Internacional de Doenças) e o DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) são comumente utilizados por psicólogos e psiquiatras como referências para a descrição de doenças mentais.

Quando um terapeuta avalia uma pessoa segundo uma "doença", ele passa então a utilizar os seus conhecimentos para lidar com a doença, e por vezes acaba deixando de lado diversas questões que compõem a existência da pessoa.

A doença não é toda existência. Em nossa vida atravessamos dificuldades, essas dificuldades não correspondem a uma totalidade de nossa existência, nem nos constitui como pessoa, mas afetam momentos e aspectos de nossa vida.

Cada pessoa é uma existência, que envolve sua história de vida, suas experiências, seus gostos e desgostos, desejos e expectativas, sua relação com os espaços onde transitou e vive, as pessoas com quem se relacionou, os livros que leu, filmes que assistiu, e muito mais!

Há vários elementos que compõem a existência e os modos de ser de cada um, uma pessoa não é somente uma "doença". Pois, quando se estabelece uma classificação diagnóstica, ela passa a ser tratada como uma "doença".

Uma terapia sem julgamentos ou classificações, corresponde a uma prática onde o terapeuta se coloca aberto a conhecer sobre a pessoa, e não somente diagnosticar sua "doença". Estando aberto, ele pode, inclusive, perceber várias potencialidades na pessoa, em meio às suas experiências de vida. Por conta disso, não há como fechar a pessoa em classificações e julgamentos, pois as classificações reduzem a pessoa, como escreveu Sören Kierkegaard, "quando você me rotula, você me nega".

A abertura para escutar a pessoa possibilita conhecer suas dificuldades e suas possibilidades. Quando uma pessoa comunica sua dificuldade, trata-se de uma oportunidade de conhecer sobre sua existência e seus modos de ser.

Cada dificuldade que uma pessoa comunica representa um fragmento de sua existência. Quando classificamos sua experiência com termos como "ansiedade", "estresse" ou "depressão", limitamos a amplitude de sua experiência existencial. Escutar a pessoa, em seus diversos aspectos, possibilita que ela também se perceba e passe a se conhecer mais profundamente.

Mais importante que classificar a pessoa, é proporcionar condições para que cada um perceba o significado de suas dificuldades para si, para que possa lidar com os obstáculos que está atravessando e impedindo seguir sua vida de maneira saudável, favorecendo a autonomia perante a própria existência.

Creio que não há como ajudar outra pessoa, no sentido emocional, classificando ela num problema ou numa doença, pois assim acabamos por rejeitar todas as qualidades de sua existência.

As dificuldades que uma pessoa atravessa surgiram em algum momento de sua existência, em meio à vivências consigo mesma e com os outros. Conforme a pessoa é escutada em seu modo de ser sem julgamentos, ela passa a se perceber e se compreender melhor, estabelecendo maior contato com sua existência, com seus modos de ser, sentir, agir e reagir perante as diferentes situações.

Quando não nos percebemos, sentimos muita dificuldade em fazer escolhas e agir diante de algumas situações. Conforme vamos percebendo como nos sentimos em cada momento, inclusive como somos afetados por nossas vivências, passamos a fazer escolhas mais congruentes em nossa vida.

Perceber e compreender nossas experiências e sentimentos é um grande passo para vivermos mais afinados com o que nos faz sentido. Ser quem somos implica em reconhecer as emoções que sentimos, sejam elas boas ou ruins, amor ou ódio, alegria ou tristeza, satisfação ou raiva, surpresa ou decepção.

A prática da terapia demanda um espaço permissivo, onde a pessoa possa ser como é e se comunicar como realmente se sente, sem necessidade de se esconder em "máscaras" ou "fachadas". Deste modo, a pessoa passa a se avaliar por si mesma, e não pelos olhares dos outros, tornando-se mais confiante consigo mesma e desenvolvendo sua maturidade emocional.

Eu não sou o outro, e não estou no lugar que ele está, aquilo que serve para mim pode não servir para ele. O terapeuta que não julga deve possibilitar à pessoa atendida desenvolver suas experiências e aprender por si mesma, fazendo suas próprias descobertas, seguindo o seu caminho de seu modo, e encontrando as soluções que lhe pareçam mais adequadas para sua vida.


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