O existencialismo e a contracultura


Contracultura corresponde a uma diversidade movimentos de questionamento, contestação e insatisfação para com a cultura dominante. A cultura dominante é aquela que se coloca como a única, verdadeira e correta, negando todas as outras formas de manifestação cultural.

A cultura dominante costuma ser defendida e propagada por pessoas que detém melhores condições econômicas, com o intuito de manter a exploração que exercem sobre os outros. Já a contracultura contraria este paradigma, refletindo sobre os direitos dos indivíduos e grupos, para uma vida mais libertária, respeitosa e saudável.

Esse movimento teve uma grande repercussão na década de 1960 nas artes, nas práticas culturais e reflexões filosóficas, porém ainda hoje temos grupos e ações que questionam e se colocam contrários aos valores da indústria capitalista e do mercado cultural. A contracultura está relacionada com as formas de vida alternativa, novas maneiras de ser e de se colocar no mundo.

Os pioneiros do movimento eram jovens que valorizavam a simplicidade, o amor e a natureza, propondo novas formas de viver, ao invés de acumular bens, da competitividade e da moralidade conservadora. As grandes temáticas dos movimentos de contracultura são a liberdade, a paz, a valorização da diversidade e das minorias.

Em diversos países, o capitalismo tem gerado o aumento da organização, da burocratização e da institucionalização, promovendo cada vez mais o controle e a massificação da população. Ao invés de estimular a liberdade e o respeito entre as pessoas, vemos cada vez mais cenas de intolerância, individualismo e desrespeito na coletividade.

Os meios de comunicação de massa estimulam certos modos de ser, pensar, agir e sentir, com intuito de movimentar o mercado, fazendo com que tenham estilos de vida muito semelhantes e uma mesma compreensão de mundo, aceitando ideias e modos de ser sem criticidade e de maneira alienada.

Numa sociedade que estimula cada vez mais o lucro, a técnica e o cientificismo, a vida e as relações entre as pessoas vão se tornando também mais mecânicas, sem emoções ou criatividade. E essas são as maiores críticas do movimento da contracultura com relação aos valores da sociedade capitalista.

Contrário a esses valores, a contracultura propõe a libertação das pessoas que estão se tornando alienadas pelos padrões de consumo e produção. Além disso, também promove a reflexão crítica sobre o modo como vivemos nossa vida, no sentido de refletir se o que valorizamos nos faz bem ou não.

A contracultura é um movimento que questiona os valores e normas conservadoras e tradicionais do ocidente, buscando espaços e meios para a expressão do indivíduo no cotidiano, valorizando a diversidade de modos de ser. Desse modo, a contracultura assume um caráter não somente reflexivo, mas também político.

Algumas características da contracultura:
  • Valorização da natureza e da vida comunitária;
  • Busca de uma alimentação natural e saudável;
  • Respeito às minorias culturais e aos diversos modos de ser;
  • Liberdade sexual, de pensamento e opinião;
  • Postura crítica aos meios de comunicação de massa;
  • Questionamento acerca dos princípios do capitalismo.

Estão relacionados com a contracultura os movimentos Hippie, Punk, Feminismo e correntes filosóficas como o Existencialismo, o Anti Positivismo, o Pós-Estruturalismo e a Escola de Frankfurt. De certo modo, todos esses movimentos questionaram os valores tradicionais, e promoviam a liberdade de ser.

Os hippies se opunham radicalmente aos valores culturais ocidentais, eles acreditavam no coletivismo e na fraternidade, e por isso sempre dividiam as suas posses e viviam em comunidade, sendo que a maioria dos hippies não tinha trabalho e nem residência fixa. Eles acreditavam que era possível mudar o mundo com gestos de generosidade, promovendo discussões sobre arte, literatura e filosofia.

Valorizando a liberdade de cada pessoa viver de acordo com seus valores e princípios, incentivando o respeito à liberdade dos outros, o contato com os próprios sentimentos e a busca de uma vida mais autêntica, o existencialismo se tornou uma filosofia base para praticamente todos os movimentos de contracultura.

"Os anos 60 foram extremamente importantes para os adolescentes. Precedida do existencialismo no pós-guerra, a geração beat dos anos 50, a contracultura explodia ao som do rock’n’roll, trazendo uma verdadeira revolução social. No mundo todo, jovens combatiam ardentemente uma civilização decadente, propondo um novo estilo de vida, criando novos valores. É a época das revoltas estudantis na Europa e nos Estados Unidos, das comunidades hippies, do amor livre, do misticismo, do rock, do culto à liberdade, das drogas psicodélicas, do não absoluto ao Sistema."
(Daniel Becker, em 'O que é adolescência')

No Brasil, os movimentos de contracultura foram muito intensos no final da década de 1960, com o Tropicalismo, o Cinema Novo e a Poesia Marginal. Artistas, intelectuais, escritores e cineastas se destacam, tais como Tom Zé, Paulo Leminski, Luiz Carlos Maciel e Glauber Rocha. A contracultura continua presente em encontros alternativos, saraus, e eventos que ocorrem fora do eixo comercial.

A contracultura é um modo de contestação e de enfrentamento da ordem vigente. Teve enorme importância no Movimento pelos Direitos Civis e pelo respeito às diversidades, temas essenciais da democracia na pós-modernidade. Além disso, ela promove a função de refletir sobre os valores que são absorvidos em nosso cotidiano, revendo o modo como estamos vivendo a nossa vida.

"Não servi, não sirvo, nem pretendo servir a nenhum centro de poder cultural, econômico, e político."
(Glauber Rocha)


Por Bruno Carrasco, terapeuta, professor e pesquisador, graduado em Psicologia, licenciado em Filosofia e Pedagogia, pós-graduado em Ensino de Filosofia, Psicoterapia Fenomenológico Existencial e Aconselhamento Filosófico. Nos últimos anos se dedica a pesquisar sobre filosofia da diferença e psicologia crítica.