Cuidado da alma em Epicteto

O cuidado da alma, conforme proposto pelo filósofo estoico Epicteto, é uma prática fundamental para uma vida tranquila e o exercídio da sabedoria interior para lidar com os paradoxos e momentos difíceis. Epicteto viveu no século I d.C., e acreditava que a alma era o núcleo da nossa essência e que devemos dedicar esforços para cuidar dela.

Epicteto entendia que a felicidade genuína não dependia da obtenção de bens materiais, do status social ou ações externas, mas dependia principalmente de nossa capacidade de cultivar uma mente tranquila e virtuosa. Ele encorajava a prática da atenção e da autorreflexão como ferramentas para examinar nossos pensamentos e emoções, identificando o que está em nosso controle e o que está fora dele.

De acordo com o filósofo, o cuidado da alma envolve uma atenção para com o nosso pensamento e a prática de virtudes como a autodisciplina, a temperança e a sabedoria. Ele enfatizava que, apesar de não termos controle sobre muitos dos eventos e circunstâncias externas, podemos escolher sobre nossos próprios pensamentos, atitudes e reações perante as situações.

Um dos principais temas abordados por Epicteto consiste na distinção entre as coisas que estão em nosso poder e as que não estão. Em seus textos, ele nos estimula a direcionar nossos esforços para aquilo que podemos controlar e escolher, como nossos julgamentos, desejos e valores; e a aceitar com serenidade as circunstâncias externas que não podemos mudar.

"Das coisas existentes, algumas são encargos nossos, outras não. São encargos nossos o juízo, o impulso, o desejo, a repulsa – em suma: tudo quanto seja ação nossa. Não são encargos nossos o corpo, as posses, a reputação, os cargos públicos – em suma: tudo quanto não seja ação nossa. Por natureza, as coisas que são encargos nossos são livres, desobstruídas, sem entraves. As que não são encargos nossos são débeis, escravas, obstruídas, de outrem."
(Epicteto, em 'Manual')

Ele destacava sobre a importância da aceitação e da serenidade diante das adversidades e contratempos que fazem parte da vida, e que são inevitáveis, sobretudo aqueles dos quais não podemos intervir ou controlar. Com isso, nos recorda que a vida é cheia de desafios, mas podemos encontrar paz interior ao adotar uma perspectiva racional e focar naquilo que está sob nosso controle.

O cuidado da alma em Epicteto também envolve o desenvolvimento de virtudes éticas. Ele argumentava que devemos praticar a justiça, a benevolência e o respeito pelos outros, reconhecendo que todos os seres humanos são igualmente dotados de racionalidade. Ao agir de maneira ética, contribuímos para o bem comum e vivemos em harmonia com a ordem natural do universo.

Sua proposta de cuidado da alma nos convida a perceber melhor o que vivenciamos, aprimorar nossos pensamentos, cultivar virtudes e viver em harmonia com a natureza. Com essas práticas podemos alcançar a tranquilidade interior e viver uma vida virtuosa, independentemente das circunstâncias externas. Neste sentido, a felicidade está em nossas mãos, dependendo do cultivo da sabedoria e tranquilidade da alma.


Por Bruno Carrasco, terapeuta, professor e pesquisador, graduado em Psicologia, licenciado em Filosofia e Pedagogia, pós-graduado em Ensino de Filosofia, Psicoterapia Fenomenológico Existencial e Aconselhamento Filosófico. Nos últimos anos se dedica a pesquisar sobre filosofia da diferença e psicologia crítica. 

Referências:
EPICTETO. Manual: a arte de viver melhor. Trad.: Edson Bini. 1 ed. São Paulo: Edipro, 2021.
PASSOS, José Davi. A filosofia como cura da alma: a formação Ética como terapia na atividade filosófica antiga. Jundiaí, SP: Paco, 2018.