Ciência e Senso Comum


O senso comum é uma forma de entender o mundo por meio de saberes da experiência de vida cotidiana, transmitido de uns para os outros sem nenhum rigor, indo do hábito à tradição. Refere-se aos saberes práticos que orientam nosso dia a dia, que se norteiam por "mini-teorias" simplificadas que produzem um específico entendimento.

Há uma grande diferença entre o saber do senso comum e o saber científico, o saber do senso comum se detêm no cotidiano, costuma partir de premissas simples e por alguns poucos fatos ou coincidências, elaborando assim suposições sem uma reflexão aprofundada. Esses entendimentos não são submetidos a testes ou experiências, e quando são, há uma grande falta rigorosidade.

A ciência é um saber que vai muito além do senso comum, propondo um certo afastamento da realidade que nos parece clara, óbvia e verdadeira, para tomar esta como um objeto de investigação. Isso possibilita a construção de um conhecimento mais apurado sobre o que temos por realidade ou por verdade.

Esse distanciamento é necessário para podermos questionar nossas crenças e costumes e seus fundamentos, de modo que nos afastamos do que temos por hábito para questionar seus fundamentos. O que antes tínhamos por verdadeiro e tão habitual passa então a ser problematizado, de modo a repensarmos nossas certezas e crenças.

Para isso, a ciência se utiliza de uma linguagem precisa e rigorosa, onde seus conhecimentos vão sendo constituídos de maneira organizada, sistemática e controlada, de modo que possa ser verificado sua validade por meio de experiências. Seu conhecimento pode ser reproduzido, utilizado, desenvolvido e refutado por outras pessoas.

Além disso, a ciência é caracterizada por sua continuidade e transformação, um novo conhecimento é produzido a partir de algo anteriormente desenvolvido, questionado, criticado, e até mesmo contrariado. A ciência é, portanto, um processo que avança e se modifica.

Por sua rigorosidade, pelo uso de métodos e técnicas específicas, inclusive por ser passível de refutação, a ciência é caracterizada por ser uma forma de conhecimento que está muito além da espontaneidade do saber do senso comum. São justamente essas características que compõem o conhecimento científico.

Portanto, a psicologia enquanto ciência é um conhecimento metódico, sistemático, organizado, verificável, objetivo, generalizado. A preocupação do cientista está na descoberta das ‘regularidades’ que existem em determinados fatos. Por isso, a ciência é generalista, isto é, suas observações feitas sobre alguns fenômenos são generalizadas e apresentadas por meio de teorias.

Enquanto forma de conhecimento, a ciência produz verdades por meio de teorias. Quando uma teoria é validada por meio de seus procedimentos e experimentos científicos, esta passa a ser tomada como verdade. Porém, o conceito de verdade em ciência é entendido sempre como provisório, pois com o passar do tempo ele pode ser questionado e refutado, sendo substituído por novos conhecimentos.

Portanto, as práticas adivinhatórias ou místicas não fazem parte da psicologia, pois não são construídas com a rigorosidade de uma ciência e muitas vezes se opõem aos princípios da psicologia, que entende o ser humano como ser autônomo, que se desenvolve e se constitui a partir de sua relação com o mundo social, histórico e cultural, que constrói seu futuro agindo sobre o mundo.

Essas práticas místicas, bem como algumas tendências de autoajuda, possuem pressupostos que contradizem com o entendimento da ciência psicológica sobre os seres humanos. Algumas delas inclusive se dizem científicas, mas não são, pois defendem entendimentos contrários à ciência, tal como a ideia de destino, a existência de forças externas ou espirituais que não estão no campo do humano.


Por Bruno Carrasco, terapeuta, professor e pesquisador, graduado em Psicologia, licenciado em Filosofia e Pedagogia, pós-graduado em Ensino de Filosofia, Psicoterapia Fenomenológico Existencial e Aconselhamento Filosófico. Nos últimos anos se dedica a pesquisar sobre filosofia da diferença e psicologia crítica.

Referência:
BOCK, Ana M. Bahia; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, M. de Lourdes. Psicologias - uma introdução ao estudo de psicologia. São Paulo: Saraiva, 2002.
SEVERINO, Antonio J. Metodologia do Trabalho Científico. São Paulo: Cortez, 1996.
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