Liberdade no existencialismo


Estamos acostumados a entender a liberdade como a possibilidade de se fazer o que quiser, ou como a possibilidade de ter coisas, no sentido de adquirir produtos, bens e serviços, ou ainda como não precisar fazer alguma atividade que gera desgosto ou desconforto, como não precisar ir ao trabalho ou não ter de limpar a casa.

Entender a liberdade como fazer o que quiser sem se importar com as consequências não tem nada que ver com o entendimento de liberdade para o existencialismo. Do mesmo modo a liberdade no sentido de "ter", como quando a pessoa possui dinheiro para comprar o que deseja, e se sente "livre" comprando coisas e fazendo atividades que o dinheiro proporciona, como viajar, comprar uma casa ou um carro.

Inclusive a liberdade no sentido de não precisar fazer algo, que é entendida com a possibilidade de não fazer uma atividade que não se sente bem fazendo ou que não faz com gosto, para poder se dedicar a outra atividade mais satisfatória. Como quando a pessoa diz "-Hoje estou livre, não vou ao trabalho", ou "-Estou livre, terminei a faculdade", pois deixar tal atividade, possibilitaria fazer outras atividades de seu interesse.

Antes de tudo, gostaria de deixar claro que não há um significado único do termo "liberdade", mas coexistem diferentes conceitos e definições sobre o que é liberdade, de acordo com o lugar, o período histórico e o ponto de vista filosófico. O intuito desse breve texto é comentar sobre a concepção de liberdade segundo a filosofia existencialista.

Segundo a concepção existencialista, especialmente em Jean-Paul Sartre (1905-1980), a liberdade está relacionada com as escolhas que fazemos. Ele entende que toda pessoa é livre, pois fazemos escolhas a todo momento, e não há como não ser livre, pois não há como não escolher.
"O homem está condenado a ser livre. Condenado, pois ele não se criou a si mesmo, e, por outro lado, contudo, é livre, já que, uma vez lançado no mundo, é o responsável por tudo aquilo que faz."
(Jean-Paul Sartre, em 'O existencialismo é um humanismo')
Para o existencialismo, a liberdade não é entendida como uma coisa, ou um objeto, que num momento se tem e em outro não se tem mais. A liberdade é constitutiva da existência humana, para Sartre o homem é liberdade. E essa liberdade consiste justamente na possibilidade e também na constante necessidade de fazer escolhas a todo momento.

Se num certo dia não desejamos ir ao trabalho, podemos faltar, ou se este trabalho não está satisfatório podemos fazer outras atividades que sejam interessantes. De fato, não há como não escolher, e não há como evitar a responsabilidade por nossas escolhas. Se somos livres para escolher, somos eticamente responsáveis pelas escolhas que fazemos, por isso teremos de lidar com as consequências de nossas escolhas.

Quando escolhemos algo, nos movemos em direção a um caminho, fazemos novas ações para em direção do que desejamos, porém nem sempre sua efetivação acontece tal como esperávamos. Por vezes deixamos de lado algumas coisas para buscar outras, pois aquelas já não nos fazem mais sentido, deste modo estamos constantemente nos renovando e transformando a nossa existência.

O que estamos fazendo agora mesmo de nossa existência foi fruto de uma escolha. Se você está lendo esse texto sobre liberdade e existencialismo foi porque escolheu ler, e se chegou até aqui foi porque algo te interessou ou te motivou nessa leitura. Mas você pode, a qualquer momento, deixar de ler esse texto e fazer outra atividade, pois você é livre para escolher, a todo momento.

A única coisa que não conseguimos escolher é deixarmos de ser livres, ou seja não escolher, pois quando não escolhemos, estamos escolhendo não escolher. A liberdade, na concepção existencialista, é uma condição humana, é inerente ao ser humano sua possibilidade de sempre escolher a si mesmo e a sua vida.

Isso não significa que podemos fazer qualquer coisa, pois há limites em nossas ações, nossa liberdade acontece sempre em situação. Um dos limites é o outro, ele nos alerta se o que estamos fazendo está desrespeitando ou o afetando de alguma maneira. Outro limite é nosso próprio corpo, não podemos fazer muitas coisas ao mesmo tempo, como não podemos ficar na água sem respirar.

Mas podemos fazer uma coisa e depois outra, podemos ficar debaixo da água com um equipamento de mergulho, podemos perguntar ao outro se o que estamos fazendo lhe incomoda. Não somos de todo privados, e não podemos fazer tudo, mas sempre podemos escolher o que vamos fazer de nossa vida a cada momento.



Referências:
REYNOLDS, Jack. Existencialismo. 2 ed. Vozes: Petrópolis, RJ, 2014.
SARTRE, Jean-Paul. O Existencialismo é um Humanismo. Petrópolis: Vozes, 2014.